Nesse artigo e no anterior, nomeei a mediação, como sendo “a faixa branca no judô, que não desistiu”, já que passou por várias cores até chegar à faixa preta! Usei a metáfora desse esporte, já que o atleta, para chegar à faixa preta, percorre um longo caminho, cheio de paisagens e cenários extraordinários e, também de cataclismos. Muitas habilidades são imprescindíveis para se tornar um atleta “faixa preta”, tais como resiliência, paciência, tolerância, disciplina, determinação, respeito, generosidade e tantas outras, na relação consigo e com o outro.
A mediação, tal como no judô, exige que os principais atores do conflito utilizem as mencionadas habilidades, para participar dessa jornada com paisagens e cenários extraordinários e outros nem tanto.
No primeiro artigo, abordei sobre a consciência do conflito pelos mediandos, sobre a vontade deles em participar da mediação, sobre a sua autodeterminação e sua assunção de responsabilidade.
Nesse artigo, acrescento outras condições inerentes à participação dos envolvidos, na mediação:
1-) Clarificação das necessidades e interesses de cada participante e formulação de pedidos:
A CNV (Comunicação Não-Violenta) trata da comunicação empática, daquela cuja fala e escuta são diferenciadas, pois reforçam a habilidade que todos os seres humanos têm de escolher as palavras, para não magoar, julgar, rotular, comparar ou gerar dor em si e no outro e/ou escutar não só as palavras, mas, principalmente, as emoções e sentimentos que estão “dentro” das mesmas, ou seja, as “palavras grávidas”.
É muito importante que cada mediando tenha claro quais são suas necessidades e interesses, para que possa formular seus pedidos um ao outro, reciprocamente. Em outras palavras, cada ator no conflito deve ampliar sua reflexão sobre o que pretende, o que lhe falta, o que anseia, o que teme etc. Ampliar a reflexão é observar-se, perceber-se: cada mediando deve se apropriar de como pensa, como sente e como faz naquele contexto do conflito. Além que colocar foco em si, também é importante fazer o mesmo com o outro.
O mediador, com sua competência e habilidade, deverá colaborar com os participantes, utilizando as técnicas próprias para a mediação. Nesse momento, o acolhimento e a empatia, por parte de todos que integram o trabalho, são fundamentais para que a mediação tenha bons resultados.
2-) Disponibilidade para cooperação:
A cooperação deve ser um valor importante para os participantes do trabalho de mediação, pois ela é a LENTE que permeia o jeito de se olhar o mundo. Assim, os mediandos devem estar disponíveis, presentes de verdade, para escutar um ao outro, de como cada um pensa, sente e faz (atitudes) no contexto. Não é qualquer escuta. Tem que ser uma escuta ativa, generosa, sem prejulgamentos, preconceitos e pressuposições. OUTRAR-SE é quando o UM sai do seu marco de referência, do seu sistema de valores, crenças, princípios etc, e entra, profundamente, no marco de referência do OUTRO e vice-versa.
3-) Respeito à Diversidade:
Encantou-me o termo “plasticidade psíquica.”, utilizado pela Mestra Florencia Brandoni, para nomear a capacidade que os mediandos têm de respeitar novas possibilidades de resolução de conflitos.
“Plasticidade psíquica é a capacidade de respeitar novas hipóteses, de sair da certeza de sua própria versão ou interpretação ou entendimento, para entrar no campo da dúvida, da admissão da ambivalência de sentimentos e de ideias diferentes e da possibilidade de abandonar uma explicação única.” (tradução livre da autora).
Essa capacidade de respeitar novas hipóteses vem da qualidade que o ser humano tem de ser flexível. A flexibilidade, assim, é um ingrediente fundamental e indispensável para as relações humanas. É indiscutível que um indivíduo, ao olhar o outro, perceba que existem diferenças. Existe um ditado popular que diz: “Somos todos feitos do mesmo barro, mas não do mesmo molde.” Cada indivíduo é único. A flexibilidade permite que aceitemos e respeitemos o outro – diferente – em seus vários domínios: pensar, sentir e fazer.
Em sala de aula, gosto de exemplificar o tema do respeito ao diferente, contando uma história impactante para os alunos. Quando termino, peço para que cada um escreva, numa folha de papel, qual foi o ponto que mais lhe tocou. Cada aluno percebe um ponto na história diferente do outro. Ficam muito surpresos com o resultado e entenderam que a história era a mesma, mas que, em cada um, ressoou de forma diferente e que todas as percepções eram legítimas!!
4-) Capacidade de Respeito, Honestidade e Confiança:
Cabe ao mediador explicar e apresentar a mediação e seus princípios aos participantes da mediação, levando-se em consideração que aquela sala é o espaço adequado à realização de conversas, no mínimo respeitosas e generosas, para a construção ou reconstrução de confiança entre todos os seus integrantes.
Esse tripé, diz respeito ao novo contrato de convivência humana, frente às novas tecnologias. No mundo globalizado em que vivemos, e com o aumento incessante e exponencial da tecnologia, temos que aproveitar esses saberes também para as relações sociais.
Leitores, cuidado!!!! Prestem atenção para que a tecnologia não gere mais conflitos em suas vidas. Reflita sobre a frase de Albert Einsten: “Temo o dia em que a tecnologia se sobreponha à humanidade. Então, o mundo terá uma geração de idiotas.”
Helena Gurfinkel Mandelbaum Helena Gurfinkel Mandelbaum
Mestre em Mediação pelo IUKB-Institut Universitaire Kurt Bosh- Maestría Latinoamericana Europea en Mediación; mediadora; terapeuta de casal, família e corporativa, consultora, docente e palestrante sobre métodos de abordagens de conflitos e crises.
@helenagmandelbaum